quinta-feira, 19 de novembro de 2009

O DECLÍNIO DA PRODUÇÃO DO CACAU

No período áureo em que as plantações continuaram a alargar-se com intensidade pelas terras ainda disponíveis, presumíveis erros de técnica cultural, originados pela ânsia desmedida de altos rendimentos e de maiores derrubas para novas plantações, trouxeram como consequência grandes prejuízos às plantas e, consequentemente, às colheitas como relata Ezequiel de Campos em 1903 “A ilha, no que ela tem de cultivável de cacau e café, está quase toda arroteada. As terras altas do Norte, às encostas centrais do Pico, de Ana Chaves, do Charuto e do Cabumbé oxalá não vá o machado, só com mira de cápsulas douradas, fazer vandalismos, o que apenas dará prejuízos sem lucro algum. A ilha num ponto ou noutro, começa já a deixar de ser a boa mãe, a terra fértil, prenhe de luz, de calor e de humidade, que apenas esgravatadas, com a ponta do machim faz saltar os cacaueiros para os encher de frutos” e acrescenta em 1955 estas outras, muito desoladoras: “Nada se aprendeu das imposições da natureza .Continuou a derrubada insensata: e a quebra na produção de cacau surdiu aterradora”.

Carta da área cultivada em São Tomé

Em 1850. o rei D. Pedro V assina um decreto em que os escravos seriam emancipados dentro de um período de 20 anos. Em 1869, todos os escravos eram declarados livres e obrigados a trabalhar como trabalhadores assalariados durante 9 anos. Passados 6 anos, foi aprovada a lei que concedia, no ano seguinte, liberdade aos escravos, mas a declaração de alforria seria atribuída, nesse mesmo ano, pelo governador Gregório José Ribeiro (1873-1876), devido à revolta maciça contra as condições desumanas em que viviam os escravos em algumas roças.
Outro problema após a abolição da escravatura consistiu no facto de os escravos terem deixado as plantações e, bêbados de liberdade, preferiam morrer de fome que voltar ao trabalho rural.
Com a recusa dos forros e os antigos escravos (gregorianos, em homenagem ao governador) trabalharem nas roças, por ser humilhante e abaixo do seu estatuto social de homens livres, a partir de 1876 foi necessário contratar mão-de-obra proveniente do continente africano, mais precisamente de Angola (5000 trabalhadores) , Gabão, costa do ouro e a Libéria.
No ano de 1881 chegaram a S.Tomé 7414 angolanos e entre 1876 a 1879 a fasquia subira para 10 341 trabalhadores contratados.

Chegada dos serviçais de Angola

Em 1895, houve uma tentativa de contratar, em Macau, cerca de 300 coolies chineses ( que vieram no navio do Estado, por ordem do Ministro da Marinha, conselheiro João António de Brissac das Neves Ferreira, mas foi um fracasso, porque segundo os roceiros os mesmos se envolviam excessivamente no jogo, provocavam o desperdício de metais preciosos e eram dados a confusões.

Coolies chineses serviçais da roça Monte Café

A partir de 1879, a contratação dos trabalhadores era efectuado apenas nas colónias, sendo que a contratação de serviçais em Cabo Verde se iniciou em 1903 e, em Moçambique, em 1908. Mas convém destacar que os proprietários forros não podiam contratar esses mesmos serviçais para as, suas roças, por proibição do governo, o que levou muitos à ruína. Diga-se que, por esta ocasião, muitas das roças já estavam na posse do Banco Nacional Ultramarino, porque os seus proprietários já se deparavam com enormes dificuldades financeiras, como foi, por exemplo, o caso da roça Agua Izé. É de se referir ainda que, em 1903, o número de trabalhadores contratados chega a 25000.

Quadro de entrada de trabalhadores contratados na ilha

A praga do rubrocinto que, em 1917, atacou os cacaueiros e a queda dramática do preço do cacau no mercado internacional resultaram numa quebra drástica na produção e na contracção das áreas cultivadas. Com tais contratempos, a exportação que, em 1909 se cifrava em 36000 toneladas, baixou, em 1921, para 26283, em 1926, para 12 470, e, em 1940, para 6972 toneladas.
Apesar dos trabalhadores contratados serem livres, viviam ainda nas sanzalas como escravos, eram castigados como estes (não obstante ser proibido por lei) e não podiam ausentar-se da propriedade agrícola. Muitos, após terminarem os seus contratos, eram mantidos nas roças, lamentando nas suas canções que “em São Tomé há porta de entrar, mas não há porta para sair”, o que ia contra a liberdade dos trabalhadores.
Este facto despertou a atenção dos anti-esclavagistas ingleses, que eram também, os principais consumidores do cacau das ilhas, situação de que resultou, em 1909, o embargo desse produto e a visita a S. Tomé e a Angola do chocolateiro William Adlington Cadbury, de Birmingham (1867–1957) e outros chocolateiros ingleses e alemães, para inspeccionarem as condições de vida dos trabalhadores nas roças.
Mas esse boicote que, na opinião de alguns, não se prendia necessariamente com tais preocu pações humanitárias, mas antes com questões comerciais que se prendiam com a concorrência que o cacau de S.Tomé fazia ao da Costa do Ouro.

William Adlington Cadbury

Em resposta ao embargo, foi retomado o repatriamento de muitos serviçais para as suas terras e aquisição de novos trabalhadores, o que se tornou insustentável para a economia do cacau, que nunca mais voltou a atingir grandes cifras na sua exportação. Tal circunstância levou o governo, no final dos anos 40, a procurar regularizar o problema da mão-de-obra, forçando os “forros” ao trabalho nas “roças”, situação que viria posteriormente a descambar no celebre massacre de 1953.

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